Não prometo nada #33: a república dos cursos
Um mergulho no universo intricado, metalinguístico e amaldiçoado dos cursos online
Oiiiii (na intenção de pedir a sua assinatura mensal),
Você sabia que essa edição marca 1 ano de Não Prometo Nada? Pois é, nem eu acredito ter sido capaz de me comprometer tanto tempo em uma coisa que só depende de mim para existir. Queria agradecer primeiramente a Deus e segundamente a você que acredita no meu trabalho.
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Não é super engraçado pensar que os pioneiros da internet doméstica acreditavam nas ideias de democratização da informação e acesso irrestrito ao conhecimento? E hoje qualquer conteúdo decente precisa mendigar por uma assinatura para manter a qualidade?
Mesmo a internet-internet estando soterrada de lixo virtual, ainda existe esse espírito de democratização do conhecimento nos usuários. Prova disso é ter gente respondendo dúvidas de desconhecidos até mesmo nos locais mais insalubres.
Lembro perfeitamente de acessar diariamente alguns sites e blogs dedicados a tutoriais para facilitar a nossa vida, tipo como tirar com uma mancha de vinho na roupa ou como fazer uma barra na calça em cinco minutos. Parece meio bobo, mas aprendi bastante coisas nesses sites. Era como se fosse um manual pra atravessar a vida prática.
Lá para o final da década de 2010, senti uma forte mudança nesse tipo de conteúdo prestativo. Os blogs saíram de cena e no lugar vieram canais de YouTube ensinando “25 coisas para fazer com uma borracha” ou “10 melhores DIY pra fazer em casa”.
O problema é que esses vídeos eram completamente inúteis. Nada do que era ensinado fazia sentido e estava fadado ao fracasso, mas os vídeos eram editados para gerar imagens “satisfatórias” e viralizar.
Sim, falsos tutoriais criados para causar uma coceguinha no cérebro e monetizar em cada clique.
Esses vídeos de tutoriais manipulados eram uma espécie de fazenda virtual para que canais de YouTube pudessem se monetizar ao extremo. Era algo tão focado no lucro a ponto de alguns incentivarem o espectador a fazer coisas perigosas, causando acidentes domésticos e mortes pelo mundo inteiro. Mesmo assim vários desses vídeos continuam no ar e, quando são derrubados, já foram espelhados em um novo canal.
Ensinamentos vazios são parte do fenômeno de esvaziamento da informação, onde o dinheiro sempre vai falar mais alto do que a credibilidade e a utilidade da coisa.
O Brasil Paralelo está no topo das buscas no Google, disseminando informações manipuladas e erradas, porque paga milhões de reais todos os meses em anúncios pro Google e pro Meta.
Junte agora esse excedente de porcaria virtual a um país continental como o Brasil, cuja grande característica é a presença maciça na internet.
Um país quebrado graças a sucessivas crises econômicas, desemprego, crescimento do emprego informal, falência geral da educação pública, pandemia e anos de discurso neoliberal vendendo a ideia de empreendedorismo e de que faculdades públicas são máquinas de doutrinação comunista.
Bem-vindos à nação dos cursos online.
Cursos online são soluções temporárias para problemas de décadas, um band-aid em cima de uma fratura exposta.
Mas, calma, not all cursos. Existe gente séria e bem-intencionada nessa história. Por isso vale a classificação:
Curso sério: cursos EAD oferecidos por universidades de verdade, ministrados por professores de verdade. Podemos discutir sobre a eficácia da metodologia EAD? Podemos, mas não é o caso.
Curso curso: cursos livres oferecidos por plataformas, instituições de ensino e empresas sérias, envolvendo pessoas qualificadas. Por exemplo: curso de escrita criativa ministrado por uma escritora.
Curso à moda caralho: cursos sem fiscalização, metodologia nem certificado, oferecidos por pessoas que podem ou não ter qualificação para tal, sem qualquer garantia de que o conteúdo ensinado está correto.
Curso de Schrödinger: cursos cujo conteúdo não é relevante, pois são apenas um meio de aplicar um golpe no máximo de gente possível.
E o maior ambiente para se qualificar em coisas sem exigências básicas educacionais é a Hotmart, um grande hospedeiro de cursos dos tipos 3 e 4. O lema da start-up diz tudo sobre o que você vai encontrar por ali: aprenda o que quiser, ensine o que souber.
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